Camané - Canta Marceneiro (2017)


Camané Canta Marceneiro


1. Cabaré / 2. Quadras Soltas / 3. Bêbado Pintor / 4. Olhos Fatais / 5. Senhora do Monte / 6. Ironia / 7. O Louco / 8. A Lucinda Camareira / 9. Mocita dos Caracóis / 10. Empate Dois a Dois / 11. O Remorso / 12. Despedida / 13. A Casa da Mariquinhas / 14. Lembro-me de ti / 15. O Pajem / 

Cabaré

Foi num cabaré de feira, ruidoso / Que uma vez ouvi cantar, comovido / Uma canção de rameira, sem ter gozo / Que depois me fez chorar, bem sentido / Era a canção da alegria, couplé novo / Mas a pobre que a cantava, eu bem a vi / Naquela noite sorria, para o povo / E ao mesmo tempo chorava, para si / É que a linda cantadeira, tão formosa / Mais linda do que ninguem, certamente / Sentia a dor traiçoeira, rancorosa / A magoar-lhe o peito de mãe, cruelmente / Tinha um filhinho doente, quase á morte / E a pobre ganhava a vida, só de fel / Cantando a rir tristemente, por má sorte / Uma canção de perdida, bem cruel

Cabaré

Fue en un cabaré de feria, ruidoso / Que una vez oí cantar, conmovido / Una canción de ramera, sin gozo / Que después me hizo llorar, bien sentido / Era la canción de la alegría, cuplé nuevo / Pero la pobre que la cantaba, yo bien la vi / Aquella noche sonreía, para el pueblo / Y al mismo tiempo lloraba, para sí / Es que la linda cantora, tan hermosa / Más linda que nadie, ciertamente / Sentía el dolor traicionero, rencoroso / Hiriéndole el pecho de madre, cruelmente / Tenía un hijito enfermo, casi de muerte / Y la pobre se ganaba la vida, con amargura / Cantando mientras reía tristemente, por mala suerte / Una canción de perdida, bien cruel

Quadras Soltas

Junto ao moinho cantando / Lavam roupa as lavandeiras / Os patos brincam nadando / Arrullam pombos nas eiras / As fontes da mina aldeia / Murmuram, gemem em coro / As águas que vão correndo / Levam consigo o meu choro / Às vezes contemplo o moinho / Que além do velho não cai / Formado no casalinho / Que era do pai do meu pai / A luz que brilha no monte / Que triste a velho daqui / É a luz humilde e pobre / Do casal onde nasci / Não queiras ir p'rà cidade / Deixa-te estar que estás bem / Não tens amor à heredade / Onde morreu tua mãe / Moinho desmantelado / Pelo tempo derruído / Tu representas a dor / Deste meu peito dorido  

Cuartetas sueltas

Junto al molino cantando / Lavan ropa las lavanderas / Los patos juegan nadando / Se arrullan palomas en las eras / Las fuentes de mi aldea / Murmuran, gimen a coro / Las aguas que van corriendo / llevan consigo mi llanto / A veces contemplo el molino / Que aunque es viejo no se cae / Construido en el caserío / Que era del padre de mi padre / La luz que brilla en el monte / Que veo triste desde aquí / Es la luz humilde y pobre / De la casa en que nací / No quieras ir a la ciudad / Déjate estar, que estás bien / No tienes amor a la heredad / Donde murió tu madre / Molino desmantelado /Por el tiempo derruido / Tu representas el dolor / De este pecho mío dolorido

Bêbado Pintor

Encostado sem brio ao balcão da taberna / De nauseabunda cor e tábua carcomida / O bêbado pintor a lápis desenhou / O retrato fiel duma mulher perdida / Era noite invernosa e o vento desabrido / Num louco galopar ferozmente rugia / Vergastando os pinhais, pelos campos corria / Como um triste grilheta ao degredo fugido / Num antro pestilento, infame e corrompido / Imagem de bordel, cenário de caverna / Vendia-se veneno à luz duma lanterna / À turba que se mata, ingerindo aguardente / Estava um jovem pintor, atrofiando a mente / Encostado sem brio ao balcão da taberna / Rameiras das banais, num doido desafio / Exploravam do artista a sua parca féria / E ele na embriaguez do vinho e da miséria / Cedia às tentações daquele mulherio / Nem mesmo a própria luz nem mesmo o próprio frio / Daquele vazadouro onde se queima a vida / Faziam incutir à corja pervertida / Um sentimento bom d'amor e compaixão / P'lo ébrio que encostava a fronte ao vil balcão / De nauseabunda cor e tábua carcomida / Impudica mulher, perante o vil bulício / De copos tilintando e de boçais gracejos / Agarrou-se ao rapaz, cobrindo-o de beijos / Perguntando a sorrir, qual era o seu oficio / Ele a cambalear, fazendo um sacrifício / Lhe diz a profissão em que se iniciou / Ela escutando tal, pedindo-lhe alcançou / Que então lhe desenhasse o rosto provocante / E num sujo papel, o rosto da bacante / O bêbado pintor com um lápis desenhou / Retocou o perfil e por baixo escreveu / Numa legível letra o seu modesto nome / Que um ébrio esfarrapado, com o rosto cheio de fome / Com voz rascante e rouca à desgraçada leu / Esta, louca de dor, para o jovem correu / E beijando-lhe o rosto, abraço-o de seguida... / Era a mãe do pintor, e a turba comovida / Pasma ante aquele quadro, original, estranho / Enquanto o pobre artista amarfanha o desenho / O retrato fiel duma mulher perdida.

Pintor borracho

Apoyado sin brío en la barra de una taberna / De nauseabundo color y madera carcomida / El borracho pintor a lápiz dibujó / El retrato fiel de una mujer perdida / Era noche invernal y el viento desabrido / En un loco galopar ferozmente rugía / Azotando los pinos, por los campos corría / Como un triste recluso huido de un penal / En un antro pestilente, infame y corrompido / Imagen de burdel, escenario de caverna / Se vendía veneno a la luz de una linterna / A la turba que se mata, ingiriendo aguardiente / Estaba un joven pintor, atrofiando su mente / Apoyado sin brío en la barra de la taberna / Rameras vulgares, en doloroso desafío / Exploraban del artista su parco salario / Y él en la embriaguez del vino y la miseria / Cedía a las tentaciones de aquel mujerío / Ni siquiera a la luz, ni siquiera al propio frío / De aquel vertedero donde se quema la vida / Insinuaban a la ralea pervertida / Un sentimiento bueno de amor y compasión / Por el ebrio que se apoyaba ante la vil barra / De nauseabundo color y tabla carcomida / Impúdica mujer, frente al vil bullicio / De vasos titilando y de chistes vulgares / Se agarró al muchacho cubriéndolo de besos / Preguntando sonriente cuál era su oficio / Él, tambaleándose, haciendo un sacrificio / Le dice la profesión en la que se inició / Ella al escuchar tal, le llegó a pedir / Que entonces le dibujase su rostro provocativo / Y en un sucio papel, el rostro de la bacante / El pintor borracho con un lápiz dibujó / Retocó el perfil y por debajo escribió / En una letra legible su modesto nombre / Que un borracho andrajoso, con el rostro lleno de hambre / Con voz rasposa y ronca la desgraciada leyó / Esta, loca de dolor, corrió hacia el joven / Y besándole el rostro, lo abrazó después / Era la madre del pintor, y la turba conmovida / se pasma ante aquel cuadro, original, extraño / Mientras el pobre artista dobla el dibujo / El retrato fiel de una mujer perdida

Olhos Fatais

Que sorte que Deus me deu / E que sempre hei-de lembrar / Embora não seja ateu / Julguei encontrar o céu / Na expressão do teu olhar / Mas deitaste-me ao deserto / Deste mundo enganador / Hoje o teu olhar incerto / Já não é um livro aberto / Onde eu lia o teu amor / Enganaste os olhos meus / Nunca mais te quero ver / Meus olhos dizem-te adeus / Teus olhos não são dois céus / São dois infernos a arder / Coração p'ra amar a fundo / Outro coração requer / Se há tanta mulher no mundo / Vou dar este amor profundo / Ao amor doutra mulher

Ojos fatales

Qué suerte la que Dios me dio / Y que siempre he de recordar / Aunque no sea ateo / Creí encontrar el cielo / En la expresión de tu mirada / Pero me echaste al desierto / De este mundo engañoso / Hoy tu mirada incierta / Ya no es un libro abierto / Donde leía tu amor / Engañaste a mis ojos / Nunca más te quiero ver / Mis ojos te dicen adiós / Tus ojos no son dos cielos / Son dos infiernos que arden / El corazón para amar profundamente / Requiere otro corazón / Si hay tantas mujeres en el mundo / Voy a dar este amor profundo / Al amor de otra mujer

Sehora Do Monte

Naquela casa de esquina / Mora a Senhora do Monte / E a providência divina / Mora ali, quase defronte / Por fazer bem á desgraça / Deu-lhe a desgraça também / Aquela divina graça / Que Nossa Senhora tem / Senhora tão benfazeja / Que a própria Virgem Maria / Não sei se está na igreja / Se naquela moradia / E o luar da lua cheia / Ao bater-lhe na janela / Reforça a luz da candeia / No alpendre da capela / Vai lá muita pecadora / Que de arrependida, chora / Mas não é Nossa Senhora / Que naquela casa mora

Señora del Monte

En aquella casa de la esquina / Vive la Señora del Monte / Y la providencia divina / Vive allí, casi de frente / Por hacer bien a la desgracia / Le dio la desgracia también / Aquella divina gracia / Que Nuestra Señora tiene / Señora tan benefactora / Que la propia Virgen María / No sé si está en la iglesia / O en aquella vivienda / Y la luz de la luna llena / Al llamar a su ventana / Refuerza la luz de la vela / En el alfeizar de la capilla / Allá van muchas pecadoras / Que lloran arrepentidas / Pero no es Nuestra Señora / Quien vive en aquella casa 

Ironia

Na vida de uma mulher / Por muito séria que a tomem / Há sempre um homem qualquer / Trocado por qualquer homem / O homem com dor sentida / Ou com sentido prazer / Deixa pedaços de vida / Na vida de uma mulher / Embora terna e amante / Jurando amar um só homem / A mulher não é constante / Por muito séria que a tomem / Tanto vale a mulher bela / Como a mais feia mulher / Perdido de amor por ela / Há sempre um homem qualquer / E por mais amor profundo / Por mais juras que se somem / Há sempre um homem no mundo / Trocado por qualquer homem

Ironía

En la vida de una mujer / Por muy serio que la tomen / Hay siempre algún hombre / Cambiado por otro hombre / El hombre con dolor sentido / O con sentido placer / Deja pedazos de vida / En la vida de una mujer / Aunque sea tierna y amante / Jurando amar sólo a un hombre / La mujer no es constante / Por muy seria que la tomen / Tanto vale la mujer bella / Como la más fea mujer / Perdido de amor por ella / Hay siempre algún hombre / Y por más amor profundo / Por más juramentos que se sumen / Hay siempre un hombre en el mundo / Cambiado por algún hombre 

O Louco

Quizes-te que eu fosse louco / P´ra que te amasse melhor / Mas amaste-me tão pouco / Que eu fiquei louco de amor / Assim arrasto a loucura / Perguntando a toda a gente / Se do amor, a tontura / Um louco tambem a sente / E se quizeres amar / Esta loucura mulher / Dá-me apenas um olhar / Que me faça endoidecer / Dá-me um olhar mesmo triste / Pois só nesta condição / Dou-te a loucura que existe / Dentro do meu coração / O lenço que me ofertaste / Tinha um coração no meio / Quando ao nosso amor faltaste / Eu fui-me ao lenço e rasguei-o

El loco

Quisiste que yo estuviese loco / Para amarte mejor / pero me amaste tan poco / Que me quedé loco de amor / Así arrastro la locura / Preguntando a toda la gente / Si del amor, la turbación / Un loco también la siente / Y si quisieras amar / Esta locura, mujer / Échame apenas una mirada / Que me haga enfermar / Échame una mirada triste / Pues sólo en esta condición / Te doy la locura que existe / Dentro de mi corazón / El pañuelo que me regalaste / Tenía un amor en el centro / Cuando faltaste a nuestro amor / Me fui a rasgar el pañuelo

A Lucinda Camareira

A Lucinda camareira / Era a moça mais ladina / Mais formosa, mais brejeira / Do café da Marcelina / De maneira graciosa / Sobre um lindo penteado / Trazia sempre uma rosa / Cor de rosa avermelhado / Eu vivi enfeitiçado / Por aquela feiticeira / Que airosamente ligeira / Servia de mesa em mesa / Tinha feições de princesa / A Lucinda camareira / Primando pela brancura / O seu avental de folhos / Realçava-lhe a negrura / Encantadora dos olhos / Nem desgostos nem abrolhos / Sofrera desde menina / Que apesar de libertina / Orgulhosa e perturbante / No velho café cantante / Era a moça mais ladina / Os marialvas em tipóias / Iam da Baixa num salto / Ver a mais linda das jóias / Aos cafés do Bairro Alto / A camareira que exalta / De tão singular maneira / Era amada pela cegueira / Que a palavra amor requer / Para mim era a mulher / Mais formosa e mais brejeira / Certa noite de fim d'ano / Em que certo cantador / Cantava ao som do piano / Cantigas feitas de amor / Um cigano alquilador / De têz bronzeada e fina / Por afortunada sina / A Lucinda conquistou / E para sempre a levou / Do café da Marcelina

Lucinda la camarera

Lucinda la camarera / Era la moza más astuta / Más bella, más maliciosa / Del café de Marcelina / De manera graciosa / Sobre un lindo peinado / Traía siempre una rosa / De color rosa enrojecido / Yo viví hechizado / Por aquella hechicera / Que airosamente ligera / Servía de mesa en mesa / Tenía facciones de princesa / Lucinda la camarera / Resaltando por la blancura / De su delantal de volantes / Se realzaba la negrura / Encantadora de sus ojos / Ni disgustos ni espinos / Sufí de esa muchacha / Que a pesar de ser libertina / Orgullosa y perturbadora / En el viejo café cantante / Era la moza más linda / Los donjuanes en tartanas / Iban de la Baixa en un salto / A ver la más linda de las joyas / A los cafés del Barrio Alto / La camarera que resalta / De tan singular manera / Era amada por la ceguera / Que la palabra amor requiere / Para mí era la mujer / Más hermosa y maliciosa / Cierta noche de fin de año / En que cierto cantante / Cantaba al son del piano / Cantigas hechas de amor / Un gitano ganadero / Te tez bronceada y fina / Por destino afortunado / A Lucinda conquistó / Y para siempre se la llevó / Del café de Marcelina 

Mocita Dos Caracóis

Mocita dos caracóis / Não me deixes minha querida / Não ouves os rouxinóis / A cantarem como heróis / A história da nossa vida / Se abalares da nossa herdade / Os teus encantos destróis / Irás atrás da vaidade / Que a moda lá na cidade / Não tem desses caracóis / Teu cabelo é lindo e loiro / De caracóis verdadeiros / Na cidade esse tesouro / É comprado a peso d´ouro / Nos grandes cabeleireiros / A tua saia redonda / Bordada de gerassóis / P´ra tua escultura bonda / Serei sempre a tua ronda / Mocitas dos caracóis / Dá-me a tua mocidade / Que eu dou-te a minha depois / Não queiras ir p´rá cidade / Porque eu morro de saudade / Mocita dos caracóis

Mocita de los caracoles

Mocita de los caracoles / No me dejes, mi querida / No oyes a los ruiseñores / Cantando como héroes / La historia de nuestra vida / Si te vas de nuestra quinta / Destruyes tus encantos / Irás tras la vanidad / Que la moda de la ciudad / No tiene eso caracoles / Tu cabello es lindo y rubio / De caracoles verdaderos / En la ciudad ese tesoro / Es comprado a peso de oro / Por los grandes peluqueros / Tu falda de vuelo / Bordada de girasoles / Para tu escultura basta / Yo seré siempre tu ronda / Mocita de los caracoles / Dame tu juventud / Yo después te doy la mía / No quieras ir a la ciudad / Porque muero de saudade / Mocita de los caracoles 

Empate dois a dois

Joguei-te um beijo, ganhei / Deste-me o dobro depois / Dei-te outro beijo, empatei / Empatámos dois a dois / Nas vastas leis do amor / Onde os beijos fazem lei / Como sou bom jogador / Joguei-te um beijo, ganhei / Ao veres meu rosto erguido / Próprio dos grandes heróis / P'ra que eu ficasse vencido / Deste-me o dobro depois / Procurei não ficar mal / Fui nobre, impus-me, lutei / Num arranque colossal / Dei-te outro beijo, empatei / Podes vencer-me, talvez / Que o meu valor não destróis / E agora à primeira vez / Empatámos dois a dois

Empate dos a dos

Te jugué un beso, gané / Me diste el doble después / Te di otro beso, empaté / Empatamos dos a dos / En las vastas leyes del amor / Donde los besos hacen ley / Como soy buen jugador / Te jugué un beso, gané / Al ver mi rostro erguido / Propio de los grandes héroes / Para dejarme vencido / Me diste el doble después / Procuré no quedar mal / Fui noble, me impuse, luché / En un arranque colosal / Te di otro beso, empaté / Puedes vencerme, tal vez / Que mi valor no destruyes / Y ahora por primera vez / Empatamos dos a dos

O Remorso

Batem-me à porta, quem é? / Ninguém responde... que medo... / Que eu tenho de abrir a porta / Deu meia-noite na Sé / Quem virá tanto em segredo / Acordar-me a hora morta? / Batem de novo, meu Deus! / Quem é, tem pressa de entrar / E eu sem luz, nada se vê / A Lua fugiu dos Céus / Nem uma estrela a brilhar / Batem-me à porta, quem é?... / Quem é?... quem é?... que pretende?... / Não abro a porta a ninguém... / Não abro a porta ´inda é cedo... / Talvez seja algum doente / Ou um fantasma, porém / Ninguém responde... que medo / Será o fantasma dela / Da que matei. Não o creio!... / A vida, a morte que importa / Se espreitasse pela janela / Jesus! Jesus! que receio / Que eu tenho de abrir a porta / Feia Noite de Natal / A esta hora o Deus Menino / Já nasceu na Nazaré / Não há perdão para meu mal / Calou-se o Galo. E o sino / Deu meia-noite na Sé / Continuam a bater / Decerto que é a Justiça / P´ra conduzir-me ao degredo / Matei, tenho de morrer / Oh! minha alma assustadiça / Quem virá tanto em segredo? / Seja quem for, é um esforço / Vou-me entregar que tormento / Que me vence e desconforta / Ninguém bateu! Oh! remorso / Não é ninguém! É o vento / Acordar-me a hora morta

El arrepentimiento

Llaman a mi puerta, ¿quién es? / Nadie responde... qué miedo... / Que tengo que abrir la puerta / Dieron medianoche en la catedral / ¿Quién vendrá tan en secreto / A despertarme en hora muerta? / Llaman de nuevo, ¡Dios mío! / Quien sea tiene prisa por entrar / Y yo sin luz, nada se ve / La luna huyó de los cielos / Ni una estrella brillando / Llaman a mi puerta, ¿quién es? / ¿Quién es? ¿Quién es?... ¿Qué pretende? / No abro la puerta a nadie / No abro la puerta, aún es temprano / Tal vez sea algún enfermo / O un fantasma, quizás / Nadie responde, ¡qué miedo! /Será el fantasma de ella / De la que maté. ¡No creo! / La vida, la muerte, qué importa / Si espiase por la ventana / ¡Jesús! ¡Jesús! Qué miedo / Que tengo que abrir la puerta / Fea noche de Navidad / A esta hora el Niño Dios / Ya nació en Nazaré /No hay perdón para mi mal / Se calló el gallo. Es la campana / Dieron medianoche en la catedral / Continúan llamando / Seguro que es la justicia / Para llevarme a prisión / Maté, tengo que morir / Ay, mi alma asustadiza / ¿Quién vendrá tan en secreto? / Sea quien sea, es un suplicio / Voy a entregarme, qué tormento / Que me vence y desconsuela / Nadie ha llamado, ¡Oh, remordimiento! / ¡No es nadie! Es el viento / A despertarme en hora muerta 

A Despedida

É sempre tristonha e ingrata / Que se torna a despedida / De quem temos amizade / Mas se a saudade nos mata / Eu quero ter muita vida / Para morrer de saudade / Dizem que a saudade fere / Que importa quem for prudente / Chora vivendo encantado / É bom que a saudade impere / Para termos no presente / Recordações do passado / É certo que se resiste / Á saudade mais austera / Que á ternura nos renega / Mas não há nada mais triste / Que andar-se uma vida á espera / Do dia que nunca chega / Só lembranças, ansiedades / O meu coração contém / Tornando-me a vida assim / Por serem tantas as saudades / Eu dou saudades alguém / Para ter saudades de mim

La despedida

Es siempre tristona e ingrata / Que se vuelve la despedida / De quien tenemos como amigo / Pero si la saudade nos mata / Yo quiero tener mucha vida / Para morir de saudades / Dicen que la saudade hiere / Que importa que se sea prudente / Llora viviendo encantado / Es bueno que la saudade impere / Para que tengamos en el presente / Recuerdos del pasado / Es cierto que se resiste / A la saudade más austera / Que la ternura nos niega / Pero no hay nada más triste / Que pasar la vida a la espera / Del día que nunca llega / Sólo recuerdos, ansiedades / Contiene mi corazón / Volviendo mi vida así / Por ser tantas las saudades / Yo doy saudades a alguien / Para tener saudades de mí

A Casa Da Mariquinhas

É numa rua bizarra / A casa da Mariquinhas / Tem na sala uma guitarra / E janelas com tabuinhas / Vive com muitas amigas / Aquela de quem vos falo / E não há maior regalo / Que a vida de raparigas / É doida pelas cantigas / Como no campo a cigarra / Canta o fado à guitarra / De comovida até chora / A casa alegre onde mora / É numa rua bizarra / Para se tornar notada / Usa coisas esquesitas / Muitas rendas, muitas fitas / Lenços de cor variada / Pretendida, desejada / Altiva como as rainhas / Ri das muitas, coitadinhas / Que a censuram rudemente / Por verem cheia de gente / A casa da Mariquinhas / É de aparência singela / Mas muito mal mobilada / E no fundo não vale nada / O tudo da casa dela / No vão de cada janela / Sobre coluna, uma jarra / Colchas de chita com barra / Quadros de gosto magano / Em vez de ter um piano / Tem na sala uma guitarra / P'ra guardar o parco espólio / Um cofre forte comprou / E como o gaz acabou / Ilumina-se a petróleo / Limpa as mobílias com óleo / De amêndoa doce e mesquinhas / Passam defronte as vizinhas / P'ra ver o que lá se passa / Mas ela tem por pirraça / Janelas com tabuinhas

La casa de Mariquinhas

En una calle oscura / La casa de Mariquinhas / Tiene en la sala una guitarra / Y ventanas con tablitas / Vive con muchas amigas / Aquella de quien os hablo / Y no hay mayor regalo / Que la vida de las muchachas / Está enferma por los cantos / Como en el campo la cigarra / Canta el fado a la guitarra / De conmovida hasta llora / La casa alegre donde vive / Está en una calle oscura / Para hacerse la importante / Usa cosas delicadas / Muchos tules, muchas cintas / telas de color variado / Pretendida, deseada / Altiva como las reinas / Se ríe de muchas, pobrecillas / Que la censuran cruelmente / Porque ven llena de gente / La casa de Mariquinhas / Es de apariencia singular / Pero muy mal amueblada / Y en el fondo no vale nada / Todo lo que hay en su casa / En el hueco de cada ventana / Sobre una columna, una jarra / Colchas de satén con barra / Cuadro de gusto vulgar / Y en vez de tener un piano / Tiene en la sala una guitarra / Para guardar su escueta herencia / Un fuerte cofre compró / Y como el gas se acabó / Se ilumina con petróleo / Limpia los muebles con aceite / De almendra dulce y mezquinas / Pasan enfrente las vecinas / Para ver o que allí pasa / Pero ella muestra como afrenta / Persianas con tablitas

Lembro-me De Ti

Eu lembro-me de ti / Chamavas-te Saudade / Vivias num moinho / Tamanquinha no pé / Lenço posto à vontade / Nesse tempo eras tu / A filha dum moleiro / Eu lembro-me de ti / Passavas para a fonte / Pousando num quadril / O cantaro de barro / Imitavas em graça / A cotovia insonte / E mugias o gado / Até encheres o tarro / Eu lembro-me de ti / E às vezes a farinha / Vestia-te de branco / E parecias então / Uma virgem gentil / Que fosse à capelinha / Um dia de manhã / Fazer a comunhão / Eu lembro-me de ti / E fico-me aturdido / Ao ver-te pela rua / Em gargalhadas francas / Pretendo confundir / A pele do teu vestido / Com a sedosa lã / Das ovelhinhas brancas / Eu lembro-me de ti / Ao ver-te num casino / Descarada a fumar / Luxuoso cigarro / Fecho os olhos e vejo / O teu busto franzino / Com o avental da cor / Do cantaro de barro / Eu lembro-me de ti / Quando no torvelinho / Da dança sensual / Passas louca rolando / Eu sonho eu fantazio / E vejo o teu moinho / Que bailava tambem / Ao vento assobiando / Eu lembro-me de ti / E fico-me a cismar / Que o nome de Lucy / Que tens não é verdade / Que saudades eu tenho / E leio no teu olhar / A saudade que tens / De quando eras Saudade

Me acuerdo de ti

Yo me acuerdo de ti / Te llamabas Saudade / Vivías en un molino / Zuecos en los pies / Pañuelo puesto a tu gusto / En ese tiempo eras tú / La hija del molinero / Yo me acuerdo de ti / Pasabas hacia la fuente / Apoyando en la cadera / El cántaro de barro / Igualabas en gracia / A la alondra inocente / Y mugías al rebaño / Hasta llenar el cántaro / Yo me acuerdo de ti / Y a veces la harina / Te vestía de blanco / Y parecías entonces / Una virgen gentil / Que fuese a la capilla / Un día por la mañana / A hacer la comunión / Yo me acuerdo de ti / Y me siento aturdido / Al verte por la calle / En carcajadas sinceras / Pretendo confundir / La piel de tu vestido / Como sedosa lana / De las ovejitas blancas / Yo me acuerdo de ti / Al verte en un casino / Fumando descarada / Un cigarro lujoso / Cierro los ojos y veo / Tu torso delgado / Con el delantal de color / De cántaro de barro / Yo me acuerdo de ti / Cuando en el torbellino / De la danza sensual / Pasas loca girando / Yo sueño y fantaseo / Y veo tu molino / Que bailaba también / Al viento que silbaba / Yo me acuerdo de ti / Y me quedo pensando / Que el nombre de Lucy / Que tienes no es verdad / Que saudades siento por ti / Y leo en tu mirada / Las saudades que tienes / De cuando eras Saudade 

O Pajem

Todas as noites um pajem / Com voz linda e maviosa / Ía render homenagem / Á Marquesinha formosa / Mas numa noite de agoiro / O Marquês fero e brutal / Naquela garganta de oiro / Mandou cravar um punhal / E a Marquesa delirante / De noite em seu varandim / Pobre louca alucinante / Chorando, cantava assim: / Óh minha paixão querida / Meu amor, meu pajem belo / Foge sempre minha vida / Deste maldito castelo

El paje

Todas las noches un paje / Con voz linda y tierna / Iba a rendir homenaje / A la marquesita hermosa / Pero una noche nefasta / El marqués fiero y brutal / En aquella garganta de oro / Mandó clavar un puñal / Y la marquesita delirante / Por la noche en su baranda / Pobre loca, alucinada / Llorando cantaba así: / Oh, mi pasión querida / Mi amor, mi paje bello / Que huya siempre mi vida / De este maldito castillo

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