Camané - Pelo dia dentro (2001)
Pelo dia dentro (2001)
01.Filosofias / 02.Templo Dourado / 03.Marcha do Bairro Alto 1995 / 04.Noite Apressada / 05.Redond /Ilha / 06.Fado da Vendedeira / 07.Ela Tinha Uma Amiga / 08.A Cantar (É que te deixas levar) / 09.Fado Sagitário / 10.Complicadissima Teia / 11.Mais um Fado no Fado / 12.Terreiro dos Passos / 13.Elegia do Amor / 14.Sem Deus nem Senhor / 15.Estranho Fulgor
Filosofias
Meu coração, que pranteias? / Não tenhas dó de ninguém / Não
queiras penas alheias / Que as tuas chegam-te bem! / Se fosses de gelo feito /
De mármore ou de granito / Não galopavas aflito / Pelas ruas do meu peito / Nos
artifícios das teias / Da triste melancolia / Que fizeste da alegria / Meu
coração, que pranteias? / Quem pensa muito não tem / Horas tranquilas, serenas!
/ Penas! Não queiras mais penas / Que as tuas chegam-te bem!
Filosofías
Corazón mío, ¿qué lloras? / No sientas dolor por nadie / No quieras penas ajenas / Que con las tuyas te basta / Si estuvieses hecho de hielo / De mármol o de granito / No galoparías afligido / Por las calles de mi pecho / En los artificios de las telas / De la triste melancolía / Que hiciste de la alegría / Corazón mío, ¿qué lloras? / Quien piensa mucho no tiene / Horas tranquilas, serenas / ¡Penas! / No quieras más penas / Que con las tuyas te basta
Templo dourado
Ao cair da noite, salta o muro / Deita abaixo a porta da
fachada / Vai p'lo corredor comprido e escuro / Corre os cantos da casa
abandonada / Pelas brechas do soalho apodrecido / Saúda com a ponta dos teus
dedos / O chão inicial que foi escondido / A pedra que guardou os teus segredos
/ Desmonta uma a uma as fechaduras / Rasga as cortinas, esventra as almofadas /
Para que as penas cubram as molduras / E voem p'las janelas escancaradas /
Destapa os retratos de família / Dos lençóis que os protegem da poeira /
Transforma cada peça da mobília / Em achas preparadas prá fogueira / P'la sala
espalha ramos de alecrim / Acende um candelabro bem no centro / Fuma um
cigarro, sai pelo jardim / E entra cantando p'lo dia dentro
Templo dorado
Al caer de la noche, salta el muro / Deja abajo la puerta ya cerrada / Va por el pasillo estrecho y oscuro / Recorre los rincones de la casa abandonada / Por las brechas de la tarima podrida / Saluda con la punta de tus dedos / El suelo inicial que fue escondido / La piedra que guardó tus secretos / Desmonta una a una las cerraduras / Rasga las cortinas, rompe las almohadas / Para que las penas cubran las molduras / Y vuelen por las ventanas abiertas de par en par / Destapa los retratos de familia / De los lienzos que los protegen del polvo / Transforma cada pieza del mobiliario / En astillas preparadas para la hoguera / Por la sala desparrama ramos de romero / Enciende un candelabro justo en el centro / Fuma un cigarro, sal al jardín / Y entra cantando al interior del día
Marcha do Bairro Alto 1995
Sou o Bairro Alto / E olho sempre de alto / Prás tristezas
que Lisboa tem / Sou o Bairro Alto / Pronto a dar o salto / Para um tempo novo
que aí vem / Todo o bom filho sai / Conforme os pais que tem / O Fado é meu pai / Lisboa, minha mãe / E eles cantando /
Vão-me preparando / Para um tempo novo que aí vem / Nem quando foi dos
terramotos do Marquês / Nem com as maldades que o Fado sempre lhe fez / Do
Bairro Alto, cá no alto, eu vi Lisboa a chorar / Deu sempre a volta, pôs-me à
solta e ensinou-me a cantar / O tempo corre, mas a vida continua / Lisboa morre
por sair comigo à rua / Fez uma marcha ao meu jeito / Vestiu-me a preceito / E
cá vou eu a desfilar / Sou o Bairro Alto / E olho sempre de alto / Prás
tristezas que Lisboa tem / Porque ela cantando / Me foi preparando / Para o
tempo novo que aí vem / O Fado é meu pai / Lisboa, minha mãe / E um bom filho
sai / Conforme os pais que tem / Sou o Bairro Alto / Pronto a dar o salto /
Para um tempo novo que aí vem / Nem quando foi seu coração incendiado / Ou
quando viu o Parque Mayer apagado / Do Bairro Alto, cá no alto, eu vi Lisboa a
chorar / Do que era pranto, fez um canto e ensinou-me a cantar / O tempo corre,
é a marcha desta vida / Lisboa morre por ver a sua Avenida / Cheia de gente tão
diferente / A ver-me tão contente / Por ela abaixo a desfilar / Sou o Bairro
Alto / E olho sempre de alto / Prás tristezas que Lisboa tem / Porque ela
cantando / Me foi preparando / Para um
tempo novo que aí vem / O Fado é meu pai / Lisboa, minha mãe / E um bom filho
sai / Conforme os pais que tem / Sou o Bairro Alto / Pronto a dar o salto /
Para um tempo novo que aí vem
Marcha del Bairro Alto 1995
Soy el Barrio Alto / Y miro siempre desde lo alto / A las tristezas que Lisboa tiene / Soy el Barrio Alto / Preparado a dar el salto / A un tiempo nuevo que ahí viene / Todo buen hijo sale / Según los padres que tenga / El Fado es mi padre / Lisboa, mi madre / Y ellos cantando / Me van preparando / Para un tiempo nuevo que ahí viene / Ni cuando sucedieron los terremotos del Marqués / Ni con las maldades que el Fado siempre le hace / Desde el Barrio Alto, aquí en lo alto, vi a Lisboa llorar / Me dio siempre la vuelta, me dejó en libertad y me enseñó a cantar / El tiempo corre, pero la vida continúa / Lisboa se muere por salir conmigo a la calle / Hizo una marcha a mi estilo / Me vistió rigurosamente / Y aquí estoy yo desfilando / Soy el Barrio Alto / Y miro siempre desde lo alto / A las tristezas que Lisboa tiene / Me fui preparando / Para un tiempo nuevo que ahí viene / El Fado es mi padre / Lisboa, mi madre / Y un buen hijo sale / Según los padres que tiene / Soy el Barrio Alto / Preparado a dar el salto / A un tiempo nuevo que ahí viene / Ni cuando su corazón fue incendiado / Ni cuando vio el Parque Mayer apagado / Desde el Barrio Alto, aquí en lo alto, vi a Lisboa llorar / De lo que era llanto, hizo un canto y me enseñó a cantar / El tiempo corre, es el curso de esta vida / Lisboa se muere por ver su Avenida / Llena de gente tan diferente / Al verme tan contento / Desfilar por su parte baja / Soy el Barrio Alto / Y miro siempre desde lo alto / A las tristezas que Lisboa tiene / Porque ella cantando / Me fue preparando / Para un tiempo nuevo que ahí viene / El fado es mi padre / Lisboa, mi madre / Y un buen hijo sale / Según los padres que tenga / Soy el Barrio Alto / Preparado a dar el salto / A un tiempo nuevo que ahí viene
Noite apressada
Era uma noite apressada / Depois de um dia tão lento / Era
uma rosa encarnada / Aberta nesse momento / Era uma boca fechada / Sob a mordaça
de um lenço / Era afinal quase nada / E tudo parecia imenso! / Imensa a casa
perdida / No meio do vendaval / Imensa a linha da vida / No seu desenho mortal
/ Imensa na despedida / A certeza do final / Era uma haste inclinada / Sob o
capricho do vento / Era minh' alma, dobrada / Dentro do teu pensamento / Era
uma igreja assaltada / Mas que cheirava a incenso / Era afinal quase nada / E
tudo parecia imenso / Imensa, a luz proibida / No centro da catedral / Imensa,
a voz diluída / Além do bem e do mal / Imensa por toda a vida / Na descrença
total
Noche apresurada
Era una noche apresurada / Después de un día tan lento / Era una rosa encarnada / Abierta en ese momento / Era una boca cerrada / Bajo la mordaza de un pañuelo / Al final era casi nada / ¡Y todo parecía inmenso! / Inmensa la casa perdida / En medio del vendaval / Inmensa la línea de la vida / En su diseño inmortal / Inmensa en la despedida / La certeza del final / Era un astil inclinado / Bajo el capricho del viento / Era mi alma, doblada / Dentro de tu pensamiento / Era una iglesia asaltada / Pero que olía a incienso / Al final era casi nada / Y todo parecía inmenso / Inmensa la luz prohibida / En el centro de la catedral / Inmensa la voz diluida / Más allá del bien y el mal / Inmensa por toda la vida / En descreimiento total
Redond/Ilha
Meu amor, de madrugada / Quando te perdes me perco / Quando
a vida está calada / Entre os braços que te cerco / Renasce o lume, e alumia /
Faz-se unidade uma idade / Em que é noite e paira o dia / Sem memória nem
vontade / E assim se treme e se trama / A teia do que nos falta / Cada lugar
minha cama / Cada cama é lua alta / E de repente aparece / Um silêncio
entretecido / Em que já nada apetece / Em que tudo tem sentido
Redondilla
Mi amor, de madrugada / Cuando te pierdes me pierdo / Cuando la vida está callada / Entre los brazos con que te estrecho / Renace el fuego, e ilumina / Se hace unidad una edad / En que es de noche y para el día / Sin memoria ni deseo / Y así se tiembla o se trama / El lienzo de lo que nos falta / Cada lugar es mi cama / Cada cama es luna alta / Y de repente aparece / Un silencio entretejido / En que ya nada apetece / En que todo tiene sentido
Fado da vendedeira
Vendedeira que apregoas / Entre muitas coisas boas / Uma
vida de cansaço / Rua abaixo, rua acima / Ligeireza de menina / Com vaidade no
teu passo / Hoje fruta, amanhã flores / Ao sabor dos teus amores / Tua voz tu
vais moldar / Ora triste, ora contente / Se a falar ficas diferente / Não te
negas a mostrar / No Inverno és calor / Com certeza sem favor / Nunca paras com
o frio / O teu lenço cai no xaile / Como quem dança no baile / Num perfeito
desvario / Na cintura bem marcado / Em teu colo pendurado / O avental é um
carinho / A brilhar por tanta rua / A saudade é toda tua / Quando mudas de
caminho
Fado de la vendedora
Vendedora que pregonas / Entre muchas cosas buenas / Una vida de cansancio / Calle abajo, calle arriba / Ligereza de muchacha / Con vanidad en tu paso / Hoy fruta, mañana flores / Al sabor de tus amores / Tu voz modularás / Ora triste, ora contenta / Si al hablar te pareces distinta / No te niegas a mostrarlo / En el invierno eres calor / Con certeza sin favor / Nunca paras con el frío / Tu pañuelo caen en el chal / Como quien danza en el baile / En un perfecto desvarío / En la cintura bien marcado / En tu regazo colgando / El delantal es un cariño / Que brilla por tu calle / La saudade es toda tuya / Cuando cambias de camino
Ela tinha uma amiga
Ela tinha uma amiga chamada Maria / Que era quem me atendia
quando eu telefonava / Ela tinha uma amiga chamada Maria / A quem ela dizia
para dizer que não estava / E quando eu insistia, e não desligava / Era sempre
a Maria / Que me mentia e me consolava / E perguntava o que é que eu lhe queria
/ Ela tinha uma amiga chamada Maria / Que nunca sabia por onde ela andava / Ela
tinha uma amiga chamada Maria / De quem se servia quando me enganava / E quando
eu lá ia, e não a encontrava / Era sempre a Maria / Que me dizia que ela não
tardava / Que me jurava que ela voltaria / Quando eu ia buscá-la, e a gente
saía / Era sempre a Maria que nos animava / Quando eu a convidava, e ela não
queria / Era com a Maria que eu sempre dançava / E quando eu inventava uma
melodia / Era sempre a Maria / Que me aplaudia, e ela não ligava / E eu ficava
a cantar prá a Maria / No cinema, no escuro, quando eu a beijava / Ela
empalidecia, a Maria corava / Ela não me ligava e adormecia / E era com a Maria
/ Que eu conversava / E que eu ficava quase até ser dia / Ela tinha uma amiga
chamada Maria / A quem ela dizia p'ra dizer que não estava / Até que outro dia
ela me telefonou / E eu disse: Maria... / E eu disse: Maria! / E eu disse:
"Maria, vai dizer que eu não estou!"
Ella tenía una amiga
Ella tenía una amiga llamada María / Que era quien me atendía cuando yo telefoneaba / Ella tenía una amiga llamada María / A quien ella mandaba decir que no estaba / Y cuando yo insistía, y no descolgaba / Era siempre María / Quien me mentía y me consolaba / Y me preguntaba para qué la quería / Ella tenía una amiga llamada María / De quien se servía cuando me engañaba / Y cuando yo iba allí, y no la encontraba / Era siempre María / La que me decía que no tardaría / Quien me juraba que ella volvería / Cuando yo iba a buscarla / Y la gente salía / Era siempre María quien nos animaba / Cuando yo la invitaba, y ella no quería / Era con María con quien yo siempre bailaba / Y cuando yo me inventaba una melodía / Era siempre María / Quien me aplaudía, y ella ni se inmutaba / Y yo me encontraba cantando para María / En el cine, en lo oscuro, cuando yo la besaba / Ella empalidecía, María enrojecía / Ella no me atendía y se adormecía / Y era con María / Con quien yo conversaba / Y que yo me quedase hasta casi ser día / Ella tenía una amiga llamada María / A quien ella mandaba decir que no estaba / Hasta que otro día ella me telefoneó / Y yo dije: María... / Y yo dije: María...! / Y yo dije: "¡María, dile que yo no estoy!..."
A cantar
A cantar, a cantar é que te deixas levar / A cantar / Tantas
vezes enganada te vi / Ai Lisboa / Quem te dera estar segura / Que o teu canto
é sem mistura / E nasce mesmo de ti / Lenço branco / Perdeste-te no cais /
Pensaste "nunca mais" / Disseram-te "até quando"? / A cantar / Fizeram-te calar
/ A dor que, para dentro, ias chorando / Tanta vez / Quiseste desistir / E
vimos te partir / Sem norte / A cantar / Fizeram-te rimar / A sorte que te
davam com má sorte / A cantar, a cantar é que te deixas levar / A cantar tantas
vezes enganada te vi / Ai Lisboa, quem te dera estar segura / Que o teu canto é
sem mistura / E nasce mesmo de ti / Tanta vez / Para te enganar a fome / Usaram
o teu nome / Nas marchas da Avenida / A cantar / Puseram-te a marchar /
Enquanto ias cantando distraída / A cantar / Deixaram-te sonhar / Enquanto foi
sonhar à toa / A meu ver / Fizeram-te esquecer / A verdadeira marcha de Lisboa
/ A cantar, a cantar é que te deixas levar / A cantar tantas vezes enganada te
vi / Ai Lisboa, quem te dera estar segura / Que o teu canto é sem mistura / E
nasce mesmo de ti
Al cantar
Al cantar, al cantar te dejas llevar / Al cantar / Tantas veces engañada de ti / Ay, Lisboa / Ojalá pudieras estar segura / De que tu canto no está mezclado / Y nace de ti misma / Pañuelo blanco / Te perdiste en el puerto / Pensaste: "nunca más" / Te dijeron: "¿Hasta cuándo?" / Al cantar / Te hicieron callar / El dolor, que por dentro, ibas llorando / Tantas veces / Quisiste desistir / Y te vimos partir / Sin norte / Al cantar / Te hicieron rimar / La suerte que te saban con la mala suerte / Al cantar, al cantar te dejas llevar / Al cantar / Tantas veces engañada de ti / Ay, Lisboa, ojalá pudieras estar segura / De que tu canto no está mezclado / Tantas veces / Para engañarte el hambre / Usaron tu nombre / En las marchas de la Avenida / Al cantar / Te pusieron a marchar / Y mientras ibas cantando distraída / Al cantar / Te dejaron soñar / Y cuando más soñabas / Según mi parecer / Te hicieron olvidar / La verdadera marcha de Lisboa / Al cantar, al cantar te dejas llevar / Al cantar / Tantas veces engañada de ti / Ay, Lisboa, ojalá pudieras estar segura / De que tu canto no está mezclado / Y nace de ti misma
Fado Sagitário
Se foi Deus que quis assim / Nem tu sabes nem eu sei / Mas tenho-te presa a mim / Por tudo o que não te dei / Se eu te desse o que tu queres / Quem sabe se nesse dia / Depois de tu me prenderes / Eu nunca mais te prendia / E se me queres como sou / Não me queiras prisioneiro / Não te daria o que dou / Se me desse por inteiro / Só posso dar-te o que dou / Porque não me dou por inteiro / E por muito que te queixes / Só espero que tu entendas / Que prefiro que me deixes / A deixar que tu me prendas / Bem sei que é contradição / Eu pedir-te liberdade / Sabendo que a condição / É ficar preso à saudade
Fado Sagitario
Si fue Dios quien lo quiso así / Ni tú lo sabes ni yo lo sé / Pero eres presa de mí / Por todo lo que no te di / Si te diese lo que tú quieres / Quién sabe si en ese día / Después que tú me aprisionaras / Yo nunca más te prendería / Y si me quieres como soy / No me quieras prisionero / No te daría lo que doy / Si me diese por entero / Sólo puedo darte lo que doy / Porque no me doy por entero / Y por mucho que te quejes / Sólo espero que me entiendas / Que prefiero que me dejes / A dejar que tú me prendas / Sé bien que es contradicción / Que te pida libertad / Sabiendo que la condición / Es ser preso de la saudade
Complicadissima teia
Quem põe certezas na vida / Facilmente se embaraça / Na vil
comédia do amor / Não vale a pena ter alma / Porque o melhor é andarmos /
Mentindo seja a quem for / Gosto de saber que vives / Mas não perdi a cabeça /
Nem corro atrás do desejo / Quem se agarra muito ao sonho / Vê o reverso da
vida / Nos movimentos dum beijo / Ando queimado por dentro / De sentir
continuamente / Uma coisa que me rala / Nem no meu olhar o digo / Que estes
segredos da gente / Não devem nunca ter fala / Talvez não saibas que o amor /
Apesar das suas leis / Desnorteia os corações / Complicadíssima teia / Onde se
perde o bom senso / E as mais sagradas razões
Complicadísima tela
Quien pone verdades en la vida / Fácilmente se complica / En la vil comedia del amor / No vale la pena tener alma / Pues lo mejor es que vayamos / Mintiendo a quien sea / Me gusta saber que vives / Pero no perdí la cabeza / No corro tras el deseo / Quien se agarra mucho al sueño / Ve el reverso de la vida / En los movimientos de un beso / Estoy quemado por dentro / De sentir continuamente / Una cosa que me atormenta / Ni en mi mirada lo digo / Que estos secretos de la gente / No deben hablarse nunca / Tal vez no sepas que el amor / A pesar de sus leyes / Desorienta los corazones / Complicadísima red / Donde se pierde el sentido / Y las más sagradas razones
Mais um fado no fado
Eu sei que esperas por mim / Como sempre, como dantes / Nos
braços da madrugada / Eu sei que em nós não há fim / Somos eternos amantes /
Que não amaram mais nada / Eu sei que me querem bem / Eu sei que há outros
amores / Para bordar no meu peito / Mas eu não vejo ninguém / Porque não quero
mais dores / Nem mais baton no meu leito / Nem beijos que não são teus / Nem
perfumes duvidosos / Nem carícias perturbantes / E nem infernos nem céus / Nem
sol nos dias chuvosos / Porque inda somos amantes / Mas Deus quer mais
sofrimento / Quer mais rugas no meu rosto / E o meu corpo mais quebrado / Mais
requintado tormento / Mais velhice, mais desgosto / E mais um fado no fado
Un fado más en el fado
Yo sé que esperas por mí / Como siempre, como antes / En brazos de la madrugada / Yo sé que en nosotros no hay fin / Somos eternos amantes / Que no amaron nada más / Yo sé que me quieres bien / Yo sé que hay otros amores / Para bordar en mi pecho / Pero yo no veo a nadie / Porque no quiero más dolores / Ni más carmín en mi lecho / Ni besos que no sean tuyos / Ni perfumes dudosos / Ni caricias perturbadoras / Ni infiernos ni cielos / Ni sol ni días lluviosos / Porque aún somos amantes / Pero Dios quiere más sufrimiento / Quiere más arrugas en mi rostro / Y mi cuerpo más quebrado / Más refinado tormento / Más vejez, más disgusto / Y un fado más en el fado
Terreiro dos passos
Ai o calor de Dezembro / Girando à volta das casas / Fazendo
festas na noite / De uma lareira apagada / Pasmada de iluminada / Ai a matéria
dos sonhos / Sem outra vida que a nossa / Em bandos partem imagens / Doirando a
luz insegura / Nas asas de feroz doçura / Quebrou-se o riso dos tédios / Na sua
própria procura / Paradas ficam nas horas / As águas que não secaram / De
desgostos que já se foram / Sei-me à volta disto tudo / Nada disto é coisa
alguma / Virei eu mesmo na noite / Vestir o espaço do centro / Da casa onde
nunca entro / Vinda da vida há uma sombra / Que encerra a vida que passa / E
nessa sombra outra sombra / Mais escura que nenhuma / Sonhando a luz que
esvoaça / Nos teus gestos que me tentam / Janelas de eu ver o mundo / Baloiça
em jeitos de rede / O descanso dos sentidos / Em memória convertidos / Quem me
achar que me procure / Quem me encontrar que me solte / Já estou para além
deste arquivo / Onde tudo sabe a pouco / E onde eu morro no que vivo
Terreiro de los pasos
Ay, el calor de diciembre / Girando alrededor de las casas / Haciendo fiestas en la noche / De una chimenea apagada / Pasmada de iluminada / Ay, la materia de los sueños / Sin otra vida que la nuestra / En bandadas se van imágenes / Dorando la luz insegura / En las alas de feroz dulzura / Se quebró la risa de los tedios / En su propia búsqueda / Paradas se quedan en las horas / Las aguas que no se secaron / De disgustos que ya se fueron / Me sé de vuelta de todo esto / Nada de esto es alguna cosa / Yo mismo giré en la noche / Para vestir el espacio del centro / De la casa donde nunca entro / Venida de la vida hay una sombra / Que encierra la vida que pasa / Y en esa sombra otra sombra / Más oscura que ninguna / Soñando la luz que revolotea / En tus gestos que me tientan / Ventanas con que yo veo el mundo / Bambolea como en una red / El descanso de los sentidos / En memoria convertidos / Quien me encuentre, que me busque / Quien me encuentre que me suelte / Ya estoy fuera de este archivo / Donde todo sabe a poco / Y donde muero en lo que vivo
Elegia do amor
O meu amor por ti / Meu bem, minha saudade / Ampliou-se até
Deus / Os astros alcançou / Beijo o rochedo e a flor / A noite e a claridade /
São estes, sobre o mundo / Os beijos que te dou / Todo eu fico a cismar / Na
louca voz do vento / Na atitude serena / E estranha duma serra / No delírio do
mar / Na paz do Firmamento / E na nuvem que estende / As asas sobre a terra /
Vivo a vida infinita / Eterna, esplendorosa / Sou neblina, sou ave / Estrela,
azul sem fim / Só porque, um dia, tu / Mulher misteriosa / Por acaso, talvez /
Olhas-te para mim
Elegía del amor
Mi amor por ti / Mi bien, mi saudade / Se creció hasta Dios / Alcanzó los astros / Besó el roquedal y la flor / La noche y la claridad / Están sobre el mundo / Los besos que te doy / Todo yo estoy imaginando / En la loca voz del viento / En la altitud serena / Y extraña de una sierra / En el delirio del mar / En la paz del firmamento / Y en la nube que extiende / Las alas sobre la tierra / Vivo la vida infinita / Eterna, esplendorosa / Soy neblina, soy ave / Estrella, azul sin fin / Sólo porque un día tú / Mujer misteriosa / Por casualidad, tal vez / Me miraste
Sem Deus nem Senhor
A luz é tão cega / Que nunca se entrega / Só se deixa ver /
Numa razão de ser / Sem sequer entender / Os olhos que a vão receber / E o
rasto que fica / É uma coisa antiga / Que a gente tem pr'a dar / E só pode
encontrar / Quando morrer a procurar / Salvo pelo amor / Só se pode ser salvo
pelo amor / No sentido perdido ganhador / Não tem Deus nem Senhor / Esta dor /
Anda à solta por aí / Que eu bem a vi / Ai, se eu pudesse parar / Se eu vos
pudesse contar / Salvo pelo amor / Não existe derrota para a dor / Com o seu
capital triturador / Não tem Deus nem Senhor / É simplesmente dor / Que é o que
faz questão de ser / Sem entender / Que a vida toda surgiu / De um sol que
nunca se viu / Nem sei se existe
Sin Dios ni señor
La luz es tan ciega / Que nunca se entrega / Sólo se deja ver / En una razón de ser / Sin siquiera entender / Los ojos que la van a recibir / Y el rastro que queda / Es una cosa antigua / Que la gente tiene para dar / Y sólo puede encontrar / Cuando muere buscando / Salvo por el amor / Sólo se puede ser salvado por el amor / En el sentido perdido ganador / No tiene Dios ni Señor / Este dolor / Va en libertad por ahí / Que yo lo vi bien / Ay, si yo pudiese parar / Si yo os pudiese contar / Salvo por el amor / No existe derrota para el dolor / Con su capital triturador / no tiene Dios ni Señor / Es simplemente dolor / Que es lo que hace cuestión de ser / Sin entender / Que toda la vida surgió / De un sol que nunca se vio / Ni sé si existe
Estranho fulgor
Deu-me Deus bodas vermelhas / E palavras como abelhas /
Esquecendo-se de mim / Deu-me a paz de alguns minutos / E palavras como frutos
/ Esquecendo-se de mim / Deu-me as ideias formosas / E palavras como rosas /
Esquecendo-se de mim / Deu-me a voz que persuade / Muito mais do que a verdade
/ Esquecendo-se de mim / Mas um dia, veio a dor / Veio o castigo sem fim / Veio
esse estranho fulgor / Apartando o bem do mal / E vi que Deus afinal / Já se
lembrava de mim...
Extraño fulgor
Me dio Dios bodas rojas / Y palabras como abejas / Olvidándose de mí / Me dio la paz de algunos minutos / Y palabras como frutos / Olvidándose de mí / Me dio ideas hermosas / Y palabras como rosas / Olvidándose de mí / Me dio la voz que persuade / Mucho más que la verdad / Olvidándose de mí / pero un día vino el dolor / Vino el castigo sin fin / Vino ese extraño fulgor / Alejando el bien del mal / Y vi que Dios al final / ya se acordaba de mí...